
VANESSA MARCONATO NEGRÃO (TEXTO) / PEDRO HENRIQUE NEGRÃO (FOTO) – Antes de mais nada: a gaiola fica aberta. Só serve de pouso aos pássaros que vem comer quirera e tomar água. Vez ou outra um se prende lá dentro, meu pai deixa o que estiver fazendo pra libertar a ave e abreviar sua agonia.
Quando mais novo não era assim, ele mesmo conta: empunhava estilingue (embora ruim de mira), criava periquito, armava arapuca pra canário da terra…
Com o tempo o coração foi amolecendo, conforme os anos avançavam, passou a se divertir com o barulhão das maritacas que pousavam comer coquinho perto do poço, com o estalar do bico do tucano que sempre passava à tardinha, com o canto do sabiá-laranjeira no desabrochar da primavera.
Hoje, tem tempo de observar atento as areias da ampulheta.
Se demora sentado na sombra da jaboticabeira, acompanhando o desenho de cada galho. Tem tempo de ficar imóvel enquanto os lagartinhos verdes se espalham no sol sem que assustem. Tem tempo de reparar no miolo escuro e perfeito da flor do quiabo. Tem tempo de ver o neto crescer enquanto, rindo, afunda as galochas na terra arada. Tem tempo de ter tempo.
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