GERALDO BONADIO – Então se descobriram envolvidos numa paixão daquelas que a gente só experimenta nos verdes anos. Os pais dele e dela concordaram e o casamento ficou acertado, devendo consumar-se dentro de um ano, ao longo do qual, sem coabitar, continuariam vivendo com seus familiares.
Só que o Deus Eterno interferiu e, de uma forma inacessível ao entendimento humano, colocou, nas mãos daqueles adolescentes, mal saídos da infância, o plano que, desde toda a eternidade, traçara para o mundo e a humanidade.
Só um Deus embriagado de amor pela humanidade, como o Deus dos cristãos, ousaria tornar seu projeto, de irromper no mundo e na vida dos humanos, dependente de dois jovens galileus que apenas sonhavam com a vida em comum e imaginavam quantos filhos haveriam de ter.
Mais loucos que o Altíssimo, Maria e José disseram sim a um projeto que implodia os seus sonhos e contrapunha, a cada futura exultação, um amargor inimaginável: conviver com uma gravidez inexplicável; peregrinar, à véspera do parto, à remota vila ancestral; sair de lá em fuga, para escapar à morte; sofrer um exílio longo e amargo, em suma, sofrer as aflições do convívio com um Deus, simultaneamente, Todo-Poderoso e criança.
Essa é a real e muito humana história do Natal, que tanta vez não vemos, porque oculto pelos guizos falsos de falsas alegrias.
O carpinteiro José, varão de idade avançada, é fruto da imaginação dos artistas que, tendo elegido por tema a natividade não lograram entendê-la plenamente.
Melhor se saiu o francês Georges Moustaki, em “Mon vieux Joseph”, canção vertida e gravada por Rita Lee, quando ainda vocalista dos Mutantes:
Olha o que foi meu bom José / Se apaixonar pela donzela / Entre todas a mais bela / De toda a sua Galileia
Casar com Deborah ou com Sarah / Meu bom José você podia /
E nada disso acontecia / Mas você foi amar Maria
Você podia simplesmente / Ser carpinteiro e trabalhar / Sem nunca ter que se exilar / De se esconder com Maria
Meu bom José você podia / Ter muitos filhos com Maria / E teu ofício ensinar / Como teu pai sempre fazia
Porque será meu bom José / Que esse teu pobre filho um dia /
Andou com estranhas ideias / Que fizeram chorar Maria
Me lembro as vezes de você / Meu bom José meu pobre amigo /
Que desta vida só queria /Ser feliz com sua Maria
Ilustração Frei Carmelo Surian ofm
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